Uma Razão para Escrever
Décio Schons
Os personagens vivem na minha memória. É impossível sufocá-los, impedir que se manifestem. Às vezes, quando penso já havê-los de todo esquecido, as imagens aparecem de repente, nítidas, as cenas a sucederem-se, como se o tempo não houvesse passado, como se elas ainda estivessem ali, congeladas, esperando uma providência, uma tomada de posição – algo que nunca soube identificar, algo que se queria de mim, mas que não conseguia perceber, por mais que me esforçasse.
Hoje cheguei a uma conclusão. O que se quer
de mim é que esses personagens e essas cenas sejam descritas, para que não se
percam e, perdendo-se, perca-se parte da história. Essas histórias e essas
cenas, muito locais e muito limitadas em sua expressão, podem, à primeira
vista, parecer coisas de pouco ou nenhum valor. Não há, porém, coisas
desimportantes quando se trata da vida de seres humanos. Alguém disse que nada
há de mais universal do que aquilo que transcorre em minha aldeia.
Por isso decidi que é
preciso escrever, grudar no papel essas vidas, muitas já encerradas, esses
acontecimentos pequenos, de pessoas pequenas em seus problemas, em suas visões
e em seus sonhos. Pessoas como outras tantas, que não tiveram a oportunidade de
gritar, de ter suas vozes ouvidas, seus clamores e seus reclamos, quando não
atendidos, pelo menos percebidos.
De todos os quadros que me vêm à mente,
os mais marcantes envolvem crianças, principalmente aquelas que morreram cedo.
É compreensível que assim seja, pois a morte marca profundamente a mente dos
jovens e a morte de crianças, certamente, aumenta muito a intensidade com que
isso acontece.
Hoje começo essa jornada. Uma pequena
história, um perfil, pelo menos uma ideia por dia. Para que, nos dias que me
restam, possa construir uma pequena galeria de retratos de uma era que se foi,
de um modo de vida que se extinguiu, de sonhos que foram sepultados muito antes
de sequer ameaçarem se tornar realidade.
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