Um Sentido para a Existência
Décio Luís Schons (*)
Nossa passagem pela Terra é curta e
cheia de tropeços. Passageiros muitas vezes involuntários dessa espaçonave
maravilhosa, não nos apercebemos das belezas que as paisagens à nossa volta nos
proporcionam, no âmbito do próprio planeta ou nos espaços imensos que o
circundam. Ocupados demais pelos grandes problemas do dia, dormimos à noite o
sono agitado pelo cansaço de quem correu muito para chegar a lugar algum.
Assuntos transcendentes nos ocupam a atenção: o campeonato de futebol, o último
episódio grotesco da novela que se aproxima do fim, a mais nova falcatrua
praticada por alguém que deveria zelar pelos recursos públicos.
Dizemos que a
ciência está muito adiantada e, de fato, os avanços impressionam. Conquistamos
o espaço sideral e colocamos estações espaciais na órbita da Terra. Eliminamos
os problemas de comunicação e temos acesso instantâneo a bancos de dados do
outro lado do planeta. As tarefas manuais são cada vez mais a exceção, na
medida em que as máquinas e os robôs se encarregam de fazer quase tudo. No
entanto, não nos sobra tempo para fazer aquilo que de fato mais importa, como,
por exemplo, dar atenção a um filho que precisa, mais que de conselhos, de um
ouvido paciente; escutar a queixa do amigo angustiado; perceber as mil mensagens
que a natureza tem para nós; mas, principalmente, escutar a nós mesmos – a voz
do silêncio, que repete sem cessar: para, presta atenção, olha para dentro de
ti.
Somos bons em
falar e muito limitados em escutar. A ansiedade do ambiente que nos cerca
contaminou a todos e a nós também. O mundo exterior e seus atrativos aprisionam
nosso espírito. Somos escravos voluntários das formas e das sensações e
desprezamos a substância. Esquecidos da Ética do Ser, optamos inconscientemente,
levados pela multidão, pela “Ética” do Parecer.
Eis, porém,
que surge, na noite da nossa miséria e do nosso desencanto, uma luz suave que
nos dá novo alento e, junto dela, a antiga mensagem que diz: “vinde a mim, vós
que estais desesperados e eu vos mostrarei o caminho da esperança e da luz”. Tal
descoberta pode acontecer das mais variadas formas: um amigo que nos chama a
atenção para essa nova-antiga faceta da existência; um acontecimento
traumatizante que nos faz parar e refletir; ou ainda o puro e simples raiar da
intuição que nos atiça o entendimento.
Começamos
então a ponderar a necessidade do equilíbrio entre a vida externa e a interna.
Se estamos encarnados neste planeta, é porque aqui temos tarefa a cumprir, lembrando
sempre que somos seres neste mundo sem, no entanto, sermos deste mundo. Nosso
destino, como espíritos eternos que somos, está muito mais acima, lá junto das
estrelas.
Entendemos
nossa natureza ternária. O fato de vivermos em três mundos simultaneamente já
não nos surpreende tanto, pois começamos a prestar atenção às particularidades
de nossa ação em cada um deles. Começamos também a nos indagar sobre a
importância relativa de cada um desses três universos paralelos que habitamos.
Embora tentados a crer que o mundo das formas e da realidade imediata seja o
mais relevante deles, descobrimos que despendemos muito tempo no mundo dos
pensamentos e das emoções e, finalmente, o raciocínio lógico nos leva a
concluir que o mundo espiritual tem a precedência, por ser o único permanente –
nossa morada definitiva para a eternidade.
Navegamos num
mar de formas-pensamento, correntes mentais positivas – as Noúres de que falou
Pietro Ubaldi – ou emanações fluídicas deletérias. Cabe-nos a responsabilidade
de sintonizar nosso receptor mental na estação mais adequada. O fato de o
aparelho não estar sintonizado não significa que a onda não esteja chegando a
ele.
O processo,
ao que se sabe, passa pelo abandono de antigos vícios, na árdua tarefa de transformar
velhos hábitos mentais alimentados em nossas existências anteriores, muitas
delas perdidas na noite dos tempos. Parafraseando Marcel Proust, diríamos que o
verdadeiro progresso não consiste em descobrir um novo mundo, mas em olhar o velho
mundo com novos olhos.
O espírita
consciente compreende a missão à sua frente como dever único e indelegável.
Sabe que não será com atitudes igrejeiras nem com prédicas lacrimosas que avançará
na senda do progresso. Será muito menos com a revolta surda, a violência sob
qualquer pretexto, a desonestidade sob qualquer disfarce.
A luta é
árdua e o embate, diário. O inimigo está em nós mesmos, representado pelos nossos
maus hábitos e nossas más inclinações. Paradoxalmente, a verdade que liberta
também está em nós, embora, na maioria das vezes, não sejamos ainda capazes de reconhecê-la.
Desenvolver a capacidade para entender o sublime chamado e então atendê-lo,
esse é todo o sentido de nossa existência terrestre, a partir do momento em que
nos descobrimos, no dizer de Teilhard de Chardin, não como seres humanos vivendo
uma experiência espiritual, mas sim como seres espirituais vivendo uma
experiência humana.
(Texto
publicado originalmente na revista “O Cruzado”, da Cruzada dos Militares
Espíritas, em abril de 2018)
(*) O autor é
General de Exército na Reserva
Meu querido amigo Schons obrigado por compartilhar esta mensagem espiritual. Eu tenho ressonância com a mesma, acho que a maior crise que enfrentamos hoje em dia é a falta de espiritualidade, mas estamos tão confusos que não identificamos de on de vem a dor.
ResponderExcluirSou católico nascido e crescido no interior do nordeste e a coisa que mais me cativou na infância foi a fé de nossa comunidade.
Grande abraço
Obrigado pela inspiração